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Álcool e cocaína: Uma vida que emergiu do fundo do poço

Ela é de uma família tradicional de Bagé. É uma mulher de 50 anos, bonita, cabelos claros, aspecto jovial e com uma comunicação fluente. Fala com desenvoltura. É mãe de um rapaz de 30 anos e de um garoto de 9. Essa mulher altiva e inteligente foi arrastada pelo álcool e a cocaína por alguns anos. Foi perto dos 50 anos que conseguiu emergir do fundo do poço. Isso há cerca de três anos, quando chegou em um beco para comprar droga e se deparou com mulheres "atiradas" e outras sentadas no colo dos traficantes. A cena a chocou e foi aí que ela parou e pensou "onde foi que cheguei". Em outras palavras, "o que eu fiz da minha vida?". Mesmo se sentindo um trapo, com a cena a frente dos olhos, foi ali que resolveu dar um basta e ir com as próprias pernas buscar ajuda. A direção da cura foi a "sala", que é o espaço onde pessoas que tem dependência química se reúnem para trocar experiências e se ajudar mutuamente, para vencer o drama do álcool e da droga.

Até chegar esse momento, que foi crucial, essa mulher "beijou" o inferno. Perdeu o respeito do filho mais velho e só agora está conseguindo reconquistá-lo. Com o filho ao lado, ela costumava dirigir o carro, alcoolizada pela cidade.

A bebida começou a entrar em sua vida por volta das 20 anos. O que no início era de forma social, foi se entranhando no organismo e na alma. Chegou um momento que o álcool não era suficiente e aí ela foi mais longe - adentrou o mundo das drogas, mais especificamente da cocaína. "Eu bebia e procurava droga", conta. Se não bastasse, ainda tomava remédios controlados.

Ela ia na casa das "amigas" e bebia. Quando faltava cerveja, saia qualquer hora da noite a procura para comprar mais. O desejo pelo álcool não tinha fim. O apetite era só pela cerveja.

Na zona em busca de droga

O desejo pela droga era insaciável. Uma noite saiu de carro e, em frente a um bar conhecido no centro da cidade, viu uma garota de programa e a chamou e disse que entrasse no carro. O pedido foi direto - que essa garota fosse até um local comprar droga, porque o medo da mulher era ser vista em uma boca de fumo. Ela preferia que alguém a visse com uma garota de programa e pensasse que ela também estava se prostituindo do que alguém a visse com droga.

Na conversa com a reportagem, ela afirma sem titubear: "Sim, eu ia na zona em busca de droga".

Três vezes o suicídio

Essa bageense revela que a bebida deixa a pessoa orgulhosa e prepotente. E era assim que se sentia quando bebia. Em meio a esse turbilhão e com a vida dilacerada, ela tentou o suicídio três vezes.

Durante a conversa que se estendeu por mais de uma hora, ela repetiu o que mais dói, que foi ter perdido o respeito do filho.

Em razão do álcool teve que trocar de profissão. Hoje uma das sequelas da dependência química é a memória que falha com frequência.


Da sombra para luz

Convicta de que já tinha chegado ao nível mais baixo que um ser humano pode se submeter, a bageense foi em busca de ajuda e hoje está "limpa", como diz. No entanto, a vigilância é permanente - ela admite que sente vontade de beber. Porém sabe que não existe o primeiro gole e sim o retorno intenso do vício. "Eu sinto vontade, mas sei que não posso", confidencia.

Assim que passou a frequentar a "sala" de ajuda, ela relata que descobriu uma vida nova. Quando o dependente químico chega no local, ele recebe uma espécie de carteirinha que, segundo ela, é uma nova certidão de vida, porque representa o recomeço.

Mulher sente vergonha

Depois de ter vivido o inferno e ressurgir das cinzas provocadas pelo álcool e a droga, a bageense quer agora ajudar outras mulheres que têm dependência e sentem vergonha de buscar ajuda. Esse é o motivo pelo qual ela procurou a reportagem do jornal Folha do Sul. O aumento do consumo de álcool e droga no meio feminino é uma preocupação.

Em análise inédita, uma publicação do Centro de Informações Sobre Saúde e Álcool (CISA), mulheres e idosos se destacam como populações mais vulneráveis, não somente por serem mais sensíveis biologicamente ao álcool, mas especialmente pelas tendências preocupantes observadas ao longo de quase uma década. De acordo com o estudo, foi verificada tendência de aumento significativo do uso abusivo de álcool entre as mulheres, com variação anual média de 3,2%, entre 2010 e 2019, chegando a 5% na faixa entre 18 e 34 anos.

Apenas uma entre os homens

Na "sala" de ajuda, hoje de mulher é apenas ela - o restante são homens. Porém sabe que o álcool está cada vez mais presente da vida de um número expressivo de mulheres bageenses que se escondem sob o véu da vergonha em ir buscar ajuda. Ela sabe que a dependência química afeta o físico, a mente e a parte espiritual.

O mais recente levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado em junho deste ano, mostrou que o aumento do consumo de bebida alcóolica engrossou sobretudo no universo feminino. No período fechado de sete anos, a quantidade de mulheres consumidoras aumentou de 31,8%, contra 2,1% de homens.

A reportagem pergunta se a pandemia tem relação com esse aumento exacerbado de álcool por parte de consumidoras, a bageense responde que quem bebe sempre acha um motivo, seja ele positivo ou negativo. Cita, como exemplo: Se a pessoa conquista um emprego, bebe para comemorar; se perde o emprego, bebe por causa da derrota; e assim acontece em uma série de situações.


Você tem problemas com a bebida

1 - Compra bebidas em lugares diferentes para que ninguém saiba a quantidade?

2 - Esconde garrafas vazias para jogá-las fora escondida?

3 - Planeja de antemão recompensar-se com algumas doses, depois de trabalhar bastante em casa?

4 - Era com frequência muito permissiva com seus filhos por sentir-se culpada por seu comportamento ao beber?

5 - tem apagamentos mentais (períodos sem nenhuma lembrança)?

6 - Alguma vez telefonou à anfitriã de uma festa para perguntar o que disse e se alguma forma se comportou de maneira tola?

7 - Toma umas doses antes de ir a uma festa mesmo sabendo que vaõ servir bebidas alcoólicas?

8 - Você se acha mais bonita e atraente quando bebe?

9 - Fica em pânico quando não pode beber, por exemplo, quando visita um parente

10 - Inventa situações para beber, convidando, por exemplo, amigos para almoçar, jantar ou para tomar drinks na sua casa?

11 - Ao se encontrar com outras pessoas, você se nega a ler artigos, ver filmes ou programas de TV que tratem de alcoolismo, ainda que os leia sozinha?

12 - Já levou garrafas de bebida na sua bolsa?

13 - Você se coloca em posição de defensiva quando alguém faz referência a sua forma de beber?

14 - Bebe ao sentir-se pressionada ou depois de uma discussão?

15 - Dirige um veículo após beber, segura que tem o domínio completo de si?

*Perguntas extraídas de um texto repassado pela entrevistada


Ajuda em Bagé

O Grupo de Bagé de Alcoólicos Anônimos tem reuniões segundas, quartas e sextas-feiras às 19h30min. O espaço fica anexo à igreja do Crucificado, na avenida Marechal Floriano, 1065.


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