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Retratos da Leitura
"As crianças precisam crescer no meio dos livros"

Freepik - Livreiro a escritor defendem importância de aproximar crianças dos livros
por Niela Bittencourt
Os dados da pesquisa "Retratos da Leitura no Brasil", divulgados pelo Instituto Pró-Livro, chamam a atenção porque, pela primeira vez, o número de brasileiros que se declaram não leitores superou o de leitores. A pesquisa revela que 53% da população não havia lido nenhum livro — físico ou digital — nos três meses anteriores ao levantamento. O dado contrasta com outro recorde nacional: o Brasil lidera o ranking mundial de tempo de tela, com média de mais de nove horas diárias conectadas a dispositivos eletrônicos. Apesar do avanço da tecnologia e do aumento da leitura em formatos digitais — hoje, 75% dos leitores usam o celular para ler livros, percentual que cresceu desde 2019 —, o número geral de leitores no país caiu.
Para o empresário Richarles Nogueira, proprietário da Leb Livraria e Cafeteria, em Bagé, os números não retratam o que ele observa no dia a dia. “Não concordo muito com essa pesquisa. Acho que cada vez aumenta mais o número de leitores. Talvez não na mesma proporção que aumenta a população, mas aumenta. Eu já vi as pessoas muito mais interessadas nos meios digitais de leitura do que hoje. Hoje, voltou a procura pelo livro, o interesse de manusear o livro e a frequência das pessoas na livraria”, afirma.
Segundo ele, a procura pelo livro físico cresceu e, para ampliar ainda mais esse interesse, é fundamental aproximar leitores de autores e das livrarias desde cedo, começando nas escolas. Nogueira defende que o poder público precisa incentivar visitas frequentes a bibliotecas e livrarias, além de apostar em projetos culturais que despertem o gosto pela leitura. Para ele, as crianças precisam manusear os livros, participar de contações de histórias, peças de teatro e bate-papos com escritores, inclusive valorizando os autores locais.
“Não concordo que as pessoas estão perdendo o interesse pelo livro. Penso que cada vez tem mais interesse, mas a gente pode melhorar”, sustenta. “Não concordei muito com essa pesquisa. O livro tem que ser mais divulgado, tem que ser mais acessível. A gente tem que aproximar mais o leitor do autor e das livrarias. As livrarias têm que ser incentivadas, têm que ser um local de visitação”, acrescenta. “E isso pode começar nas escolas, esse hábito de visitar a livraria. Isso é uma maneira de a gente aproximar o leitor do livro e do autor”, enfatiza, ao citar a importância de projetos e do envolvimento do poder público.
Contudo, menciona que faz a sua parte como empresário do setor. “A gente vem tentando incentivar, convidar escolas para visitar a livraria, tentando conscientizar os professores de que as crianças podem manusear o livro, podem conviver com o livro”, sustenta. “As crianças precisam manusear o livro, precisam crescer no meio dos livros”, assevera.
Realidade conhecida
Já o escritor Rodrigo Tavares avalia o cenário de forma mais crítica. Para ele, a pesquisa apenas confirma uma realidade conhecida. “O brasileiro não lê. Cada vez mais vemos que alcançar um público leitor novo é complicado, seja pelas inúmeras distrações e compromissos da vida moderna, seja pelo próprio mercado — que insiste em valorizar apenas determinados tipos de escrita”, opina.
E ele também faz uma crítica ao atual modelo de educação. “Como querer criar um hábito de leitura em uma criança que passa o dia envolvida em milhões de atividades na escola e fora dela (dança, inglês, futebol etc.), em um mundo em que cada vez mais os pais precisam ocupar as crianças fora de casa para terem tempo de trabalhar e pagar as contas? O adulto que não está lendo hoje foi uma criança superocupada e sem tempo para ler”, sustenta. E não é nada otimista ao afirmar: “Para mudar, precisaremos do espaço de uma geração”.
Tavares também alerta para o fato de o Rio Grande do Sul, tradicionalmente reconhecido como um Estado de leitores, enfrentar desafios, principalmente para escritores jovens. “Enquanto escritor, vejo que o RS é um dos locais mais difíceis de se apresentar como um escritor jovem. Por aqui, preferem os clássicos e os autores mortos”, contextualiza.
Mas Tavares admite que há muitos professores, seja dos colégios ou das universidades, que trabalham muito duro para formar uma nova geração de escritores. “Vera Medeiros na Unipampa, Milene Abott no Espírito Santo, apenas para ficar com alguns exemplos”, cita. “Para mudar essa realidade, é necessário ação individual — cada um se esforçar para mudar. Ficar esperando posturas governamentais é um modo fácil de não se envolver com o problema”, critica.
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