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João Eichbaum

CATÁSTROFE PEDAGÓGICA?


Em seus textos, dois colunistas da Zero Hora resolveram qualificar o comportamento do homem, passada que seja essa desgraça que assolou o Rio Grande. Não se sabe se o fizeram como profetas enviados por alguma dessas divindades inventadas pelo homem, ou se foi falta de melhor inspiração para ornar suas colunas com algum pensamento que surtisse efeito agradável.  

Para um deles, “sairemos maiores”. Para o outro, “sairemos melhores”. São dois adjetivos distintos, não são sinônimos, mas foram empregados no mesmo sentido: que os homens assimilarão a massacrante lição das águas e se tornarão criaturas mais virtuosas, mais valiosas, ou menos animalescas. 

No decorrer desses tempos catastróficos nos deparamos, isso sim, com o melhor e o pior das criaturas. Nenhuma lição nova sobre os homens dessas plagas gaúchas proveio da gigantesca enchente. Vimos criaturas que mostraram desprendimento, coragem, e amor ao próximo. Mas os comportamentos foram ditados por motivos distintos.   

Em muitos  a nobreza da caridade cristã triunfou sobre o ego. Mas houve também quem viu, nessa ajuda ao próximo, a ocasião de sair do anonimato, para promover sua própria realização. Ou seja, uns por autêntico amor ao próximo; outros, pelo amor natural a si mesmo, que o ego de todo mundo exige. 

Objetivamente, não houve diferença na eficácia dos atos de uns e de outros, porque todos tiveram em mira, na realidade, o bem das pessoas atingidas pelo violento fenômeno das águas. E isso é o que realmente importa: que, entre as criaturas humanas, sempre haja alguém disposto a dar o melhor de si, para quem está a braços com dificuldades de monta. 

Na outra ponta, houve a amostra contrária: a do criminoso, do mau elemento, do marginal, daquele que assenta seus objetivos na violência, na ameaça, e procura desse modo tirar proveito tanto do bem, quanto do mal. Não faltaram cenas de assalto e de furto, tanto contra quem ajudava as vítimas da enchente, como contra essas indefesas criaturas. 

Em que base da realidade, da vida vivida, da história do mundo e do homem, poderia assentar essa afirmação de que sairemos dessa “maiores” ou “melhores”? A enchente que assolou o Rio Grande do Sul foi apenas uma das incontáveis e violentas catástrofes que já atingiram os habitantes do planeta terra: guerras, naufrágios, acidentes aéreos, pandemias, incêndios, erupções vulcânicas, e todo o tipo de perdas pessoais. E nada disso mudou o comportamento humano, por uma razão muito lógica: seus hábitos, enquanto animal humano, não sofreram modificações de monta.  

O homem de hoje não é diferente do homem da mitologia bíblica, a começar por Adão e Eva. A atitude de Caim para com o próprio irmão nunca deixou de existir. Pelo contrário, se multiplicou. A expulsão do paraíso, que poderia ser a maior lição, para tornar o homem “maior” ou “melhor”, não deu em nada, nesse sentido. A imolação de Jesus Cristo, com o fim de melhorar a humanidade, nunca passou de pedagogia sangrenta e ineficaz para o fim proposto. 

A enchente de 1941 produziu outro tipo de homem? 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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